Desde 2015 o uso medicinal de derivados da cannabis está regulado no Brasil, quando a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou a RDC 17 definindo as regras para o acesso via importação individual. Desde então, houve dois avanços importantes dentro da agência: o primeiro, ao final de 2019, quando a RDC 327 criou a categoria de produtos à base de cannabis e os critérios para que eles cheguem às farmácias e, o segundo, no início de 2020 quando a RDC 335 mudou as regras de 2015 e simplificou a burocracia da importação individual.
Duas empresas já têm produtos enquadrados na primeira resolução, sendo vendidos ou em vias de serem lançados em drogarias, e há outras 12 com pedidos na Anvisa aguardando a sua autorização sanitária para comercialização.
Outras centenas de marcas de produtos internacionais se acotovelam em torno dos – ainda raros – médicos prescritores para ganhar espaço no mercado nacional, em um processo pouco eficiente de importação individual nas regras da segunda resolução.
Longe de ser perfeita, a regulamentação do uso da cannabis medicinal no Brasil existe e o acesso é cada vez mais simples. Seja pela facilidade de comprar produtos nas drogarias ou pelo fato de os preços dos importados estarem caindo mês a mês diante da alta competitividade.
Aí aquele seu amigo vai comentar “ah, quando eu morei na Califórnia nos anos 90 esses produtos já estavam lá, o Brasil está atrasado”. Eu diria que em termos.
Por mais que o cânhamo – uma subespécie da cannabis da qual se podem extrair as formulações para uso terapêutico – esteja liberado a nível federal nos Estados Unidos, a cannabis está classificada por lá como substância controlada de Classe I, “o que significa que, por definição, ela não tem uso médico aceito e não é segura, mesmo sob supervisão médica, naquele país. Essa posição prejudica a capacidade dos médicos de aconselhar os pacientes ou de influenciar a florescente indústria da cannabis”, indica o relatório The Medicine of Cannabis: An Overview for Medical Professionals and Policymakers da NCIA, Associação Nacional da Indústria da Cannabis, dos Estados Unidos.
Ou seja, você pode comprar facilmente um frasco de óleo de CBD em um estado americano regulado e tomar por conta própria para atenuar uma ansiedade ou insônia. Até aqui, tudo bem.
Mas um paciente que sofre com doença grave – vamos dizer Doença de Chron, Parkinson, Epilepsia ou Câncer -, que já esteja tomando medicamentos continuamente e queira o apoio de um médico nos Estados Unidos, vai descobrir que o ambiente legal cria dificuldades para que profissionais da saúde ofereçam orientações claras e seguras sobre o uso terapêutico da cannabis. Essas são queixas dos próprios profissionais.
De volta ao Brasil, uma consulta com médico experiente na prescrição de produtos de cannabis pode ser feita via telemedicina por valores em torno de R$250. Um produto de alta qualidade importado custa a partir de R$199. O frete segue alto (cerca de R$199), afinal, a regulamentação que permite a importação individual impede a estocagem do óleo de cannabis no Brasil. Ou seja, com menos de R$650 é possível começar um tratamento no Brasil com acompanhamento qualificado de um médico e totalmente online, com o apoio da Dr. Cannabis.
O acesso existe e está crescendo. Menos de 1% dos médicos habilitados pelos Conselhos Regionais de Medicina (CRMs) prescrevem cannabis atualmente, mas há novos cursos de formação médica na prática da medicina canabinoide surgindo a cada semana. Clínicas anunciam ser especialistas no tema.
Há, inclusive, pacientes de outros países e brasileiros morando fora que procuram médicos em solo nacional para receber orientação sobre o uso adequado e dosagem desses produtos. A telemedicina, permitida excepcionalmente durante a pandemia, com certeza facilitou esse cenário.
O Brasil já conta também com o seu próprio congresso médico de cannabis medicinal online e gratuito que terá a sua segunda edição em agosto deste ano. Mas, acima de tudo, temos por aqui relatos animadores de pacientes que encontraram nos derivados da cannabis um alívio para as suas doenças crônicas.
Cada país começa por um viés a trilhar a regulação da cannabis. Uns com foco no mercado, como a Colômbia e o Líbano, que regulou com a intenção de recuperar a sua economia. Outros com foco em satisfazer uma demanda interna de uso adulto e auto cultivo, como o Uruguai e, mais recentemente, o México.
Será que existe uma forma ideal para um país começar a regular a cannabis? Guimarães Rosa já dizia que “Pãos ou pães, é questão de opiniães” visto que, dado o primeiro passo, o caminho liberação do uso amplo da cannabis é sem volta.
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